A contemporaneidade portuguesa: em busca de si na literatura de Saramago e Valter Hugo Mãe.

Fonte: Acervo do Pinterest.

A contemporaneidade foi responsável por romper com os padrões sociais, culturais e estilísticos dos artistas e escritores, baseado nisto abordaremos aqui o viés da escrita contemporânea de José Saramago e Valter Hugo Mãe.

Em primeiro momento, temos a presença de Saramago, consagrado por sua preocupação em retratar obras literárias reais, abocando os primas da subjetividade alinhada com o cotidiano, em sua principal obra “Ensaio sobre a cegueira” (1994). É o papel da literatura perceber e demonstrar as tensões do novo em que se vive.

A escrita de Saramago tem uma linguagem predominantemente ligada ao discurso indireto livre e a abundância de vírgulas, com parágrafos extensos. Essa estrutura constrói uma narrativa próxima à linguagem cotidiana, mas, ao mesmo tempo experimental, com a variedade de vozes presente, em uma construção polifônica, na qual se misturam as vozes do narrador e das personagens.

A polifonia não se constitui apenas nessa mistura, mas trazem à tona discursos diferentes, em constante complexidade. Essa postura é capaz de levar o leitor ao questionamento de determinadas ideias tidas como verdadeiras, percebe-se o caráter artificial, ou ainda de orientar o leitor a uma reflexão mais marcada acerca de suas próprias certezas.

Em segundo momento, percebe-se na contemporaneidade uma duplicidade dos agentes, colocando em prova que, o homem está sempre em um processo contínuo de seu discurso e de si. Saramago escreveu sobre os mais diversos tipos temáticos que pudesse resgatar essa ideologia do cotidiano e seus problemas, foram temas de suas obras: amor, morte, moral, ambição, poder, etc.

Assim como José Saramago, Valter Hugo Mãe foi uma das personalidades da contemporaneidade, em que quanto mais o sujeito contemporâneo busca cessar suas dúvidas com mais dúvidas ele volta. Marcado por seus recursos estilísticos e uma assinatura nomeada intrigante, Mãe foi discípulo da literatura de Saramago.

Vale ressaltar o presente nome da protagonista de Mãe em sua principal obra “O remorso de Baltasar Serapião” remete ao nome de um dos personagens caros a Saramago (Baltasar), e a trama “O Remorso” compartilha um “ambiente” (a pobreza, a família reunida, o trabalho extenuante).

A influência de um autor sobre outro nos remete ao processo constitutivo natural de toda escrita, é importante salientar essa situação como uma espécie de continuidade de um círculo literário estável (contemporaneidade). “ Por meio dessa continuidade e nessa consagração por autor de grande prestígio, a posição privilegiada alcançada por Mãe, o eleva a uma posição dentro da hierarquia do campo literário por uma demanda dos autores respeitados. ”

Em terceiro momento, Mãe, também caracterizado por seu estado de ensimesmamento – um estado de pertença afetiva perante outros que não dizem respeito a laços sanguíneos ou socialmente contratuais, em principal, o casamento. – O autor lida com uma exploração dos sentimentos e comportamentos dos personagens a fim de que eles, como indivíduos, são inseridos em uma bolha que retrata temáticas de aceitação, casamento, interesse, conforme é colocado na obra O filho de mil homens (2013).

Por fim, ambos autores buscaram direcionar-se para um viés social, cotidiano, que trata do comportamento do homem e a ruptura com o pensamento tradicional. Dispostos a um novo pensar e fazer, a dúvida se engradece nas suas poesias, contos e romances, um foi o precursor de uma estilística e maneira de pensar no olhar humano, único; já o outro permaneceu nessa linha postulando seus próprios traços e sua própria perspectiva do que seria ser contemporâneo na literatura.

Referências

ALMANAQUE, Literário. Do modernismo à contemporaneidade em Portugal. Disponível em: < https://mosqueteirasliterarias.comunidades.net/do-modernismo-a-contemporaneidade-em-portugal>. Acessado em: 20 de agosto de 2019

SILVA, Danilo S. de Queiroz. Valter Hugo Mãe na cena literária contemporânea. 2014. Disponível em: < https://litcult.net/2014/12/23/valter-hugo-mae-na-cena-literaria-contemporanea/>. Acessado em: 20 de agosto de 2019.